DESVIOS DE PRECIPITAÇÃO NA REGIÃO SUDESTE DO BRASIL

Iracema F.A Cavalcanti, Cleber Afonso de Souza, Vernon E. Kousky, Eduardo B.M. Barbosa
Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos/INPE
Climate Prediction Center/NCEP

1. Introdução
Para destacar os anos em que ocorreram déficits mensais prolongados de chuva na região Sudeste, são apresentadas anomalias de precipitação média nessa região, no período de 1962 a 2001. São apresentadas também, separadamente, as anomalias nos anos El Nino 72/73, 82/83, 86/87, 91/92, 97/98 e nos anos La Nina 84/85, 88/89, 99/2000. Séries temporais diárias de precipitação no período de inverno e primavera indicam os períodos com precipitação persistente no inverno, e o início da estação chuvosa na estação da primavera, no período de 1979 a 1997.

2. Casos extremos de déficit de precipitação no Sudeste do Brasil
As anomalias mensais foram calculadas considerando a climatologia de 1961-2000, com dados do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), centros regionais de Meteorologia e de plataforma automática de coleta de dados (PCDS). Na fig. 1 são apresentadas as séries temporais de anomalias de precipitação média para a região Sudeste (150S-240 S; 540W-400W).
Nestas séries são identificados os anos em que ocorreram anomalias negativas de precipitação em vários intervalos com relação à intensidade. (Tabela I). Foram destacados os anos de 1963/1964, 1970/1971, 1974/1975/1976, 1984, 1988, 1990, 1992/1993 e 2001. Nota-se que o caso mais crítico nesse período ocorreu no final de 1993, quando em novembro e dezembro as precipitações médias espaciais ficaram abaixo de 90mm, e em janeiro e março do mesmo ano haviam ocorrido precipitações médias espaciais abaixo de 75mm. Durante todo o ano foram observadas anomalias negativas de precipitações médias espaciais, exceto em fevereiro, quando ocorreram anomalias positivas entre 10 e 15 mm.
Fig. 1 - Anomalias mensais de Precipitação na Região Sudeste (150 S - 240 S; 540 W - 400 W) nos anos de 1961 a abril de 2001.

A configuração espacial das anomalias de precipitação, nos meses de setembro a fevereiro, nos anos mais críticos é mostrada na Fig. 2. Em 1963 os 3 meses da primavera registraram precipitações abaixo da média, situação que se agravou em dezembro. Em fevereiro de 1964 a situação melhorou, mas a estação chuvosa da região Sudeste já estava terminando (Fig.2 a). Em 1993 também foi observada precipitação abaixo da média na primavera, com a situação também piorando em dezembro. Após a ocorrência de chuvas um pouco acima da média em janeiro, a situação voltou a ser de chuvas abaixo da média em fevereiro, o que resultou em uma estação chuvosa deficitária em 1993/1994 (Fig.2 b). Na primavera de 2000 ocorreram precipitações abaixo da média apenas em outubro, porém os meses de janeiro e fevereiro de 2001 apresentaram valores abaixo da média (Fig.2c).

Na tabela II são especificados os valores de anomalias negativas na Região Sudeste em ordem decrescente. Nota-se que o mês de janeiro de 2001 foi o segundo mês mais seco dos últimos quarenta anos.

0 = P < -10 -10 = P < -15 -15 = P < -30 -30 = P < -45
-45 = P < -60 -60 = P < -75 = P < -90 P = -90

Tabela I - Ocorrência de anomalias negativas de precipitação na Região Sudeste (150S-240 S; 540W-400W).
MÊS/ANO VALOR MÊS/ANO VALOR
Dez /1993 -187,5 Out, nov /1986 -51,0
Jan / 2001 -107,5 Mar /1972 -51,0
Nov /1993-95,0 Jan /1972 -50,0
Dez /1963 -90,0 Mar /1977 -50,0
Jan /1990 -90,0 Nov /1991-50,0
Fev/1977 89,0 Mar /1970 -47,5
Jan /1976 -88,5 Jan /1975 -47,5
Jan /1993-88,0 Mar /1986 -47,5
Mar /1980 -87,5 Dez /1991 -47,5
Jan /1971 -86,5 Dez /1992-45,0
Dez /1970 -85,0 Dez /1988 -45,0
Mar /1963 -82,5 Jan /1989 -45,0
Nov /1974-80,0 Set /1988 -43,5
Dez /1990 -80,0 Set /1963 -42,5
Mar /1993 -80,0 Out /1989-42,5
Fev /1974 -72,5 Out /1963 -40,0
Jan /1984 -70,0 Fev /1973 -40,0
Nov /1988-70,0 Nov /1989 -40,0
Fev /1990 -70,0 Nov /1963 -37,5
Fev /1984 -68,5 Mai /1963-35,0
Fev /2001 -65,0 Fev /1994 -35,0
Mar /1964 -60,0 Mar /1989 -32,5
Fev /1981-58,5 Mar /1992 -32,5
Mar /1975 -57,5 Jan /1963 -30,0
Dez /1975 -55,0 Set /1974-30,0
Mar /1968 -52,5 Fev /1991 -30,0
Out /1993 -52,5
Out /2000 -52,5
Tabela II - Valores mensais de anomalia negativa (mm) na Região Sudeste, na área compreendida entre (150S - 240 S; 540W - 400W), em ordem decrescente.

ANOMALIA DE PRECIPITAÇÃO - 1963

Fig. 2a - Chuvas acima da média (escala azul) e abaixo da média (escala vermelha/ amarela).

ANOMALIA DE PRECIPITAÇÃO - 1993


Fig. 2b - Chuvas acima da média (escala azul) e abaixo da média (escala vermelha/ amarela).

ANOMALIA DE PRECIPITAÇÃO - 2000

Fig. 2c - Chuvas acima da média (escala azul) e abaixo da média (escala vermelha/ amarela).

3. Anomalias em anos El Niño e La Niña
Na Fig.3 são mostradas as séries temporais de anomalias de precipitação nos anos 72/73, 82/83, 86/87, 91/92, 97/98, 84/85, 88/89 e 99/2000. A tabela III indica os meses em que os desvios ficaram acima de 30 mm (+) e -30 mm (-).
Fig. 3a - Anomalia de precipitação na Região Sudeste no ano de 72/73, 82/83, 86/87, 91/92 e 97/98.

Fig. 3b - Anomalia de precipitação na Região Sudeste no ano de 84/85, 88/89 e 99/2000.

Nota-se que nos meses de primavera e verão, as anomalias estiveram acima de 30 mm em out, nov 72, out 73; out 82, jan, set, out 83, dez 86, jan, out 92, jan, nov 97 e fev 98. Anomalias negativas maiores que 30 mm ocorreram em jan 72, jan, fev 73, fev, nov 82, out, nov 86, fev 87, fev, out, nov 91, nov 92. Esses resultados mostram a grande variabilidade das anomalias na região Sudeste, a qual apresenta precipitação abaixo ou acima da média em diferentes meses, nos anos El Nino. Nos anos La Nina 84/85 e 88/89 ocorreram anomalias negativas na maioria dos meses de primavera/verão. Uma análise mais detalhada das ocorrências de anomalias relacionadas com a variabilidade do ENSO dentro de cada período está sendo efetuada.


EL NIÑO
Ano jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez
72 - - + + +
73 - - + +
82 + - + + -
83 + + + + + + +
86 - - + - - +
87 - + +
91 - + - -
92 + - + + + -
97 + + +
98 +


LA NIÑA

Ano

jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez
84 - - - - -
85 - - - -
88 + - - -
89 - - - -
99 - -
00 + + - - + - +
01 - - -
Tabela III - Meses em que as anomalias mensais na Região Sudeste ficaram acima de 30 mm (+) e acima de -30 mm (-).

4. Precipitação diária na região Sudeste nas estações de inverno e primavera
Climatologicamente há pouca precipitação durante o inverno sobre o Sudeste .do Brasil. O período de maior precipitação é o de verão seguido pela primavera (Fig.4). Na época de inverno as chuvas que ocorrem na região são associadas à atuação de sistemas sinóticos, como frentes frias, que podem causar excesso se ficarem estacionárias na região, por exemplo quando há bloqueios na atmosfera.
Fig. 4 – Climatologia da Precipitação Acumulada trimestral (mm) do Brasil, considerando o período de 1961 a 2000
(Fonte de dados: INMET, serviços estaduais de Meteorologia do Brasil, a partir de 1997 e plataforma de coleta de dados).

Uma análise diária das séries temporais da média espacial de precipitação na região Sudeste (150S-240S; 400W-540W), no período de maio a agosto de 1979 a 1997, mostra que há alguns casos em que ocorreram precipitações por vários dias na região, porém os valores são baixos. Destacam-se os períodos do fim de maio/começo de junho de 1983, agosto de 1986, fim de julho de 1989, fim de maio/começo de junho de 1994 e junho de 1997 (Fig. 5).

As séries temporais de precipitação média espacial na região Sudeste, para o período de setembro a dezembro são apresentadas na Fig.6. Observa-se que o início das chuvas mais intensas ou que abrange uma área maior, dentro da região, ocorre no final de outubro/começo de novembro. Entretanto, em alguns anos podem ser destacados também, embora com valores menores, os meses de setembro de 1979, 1983, 1992 e 1996. São observados também os baixos valores na primavera de 1982, 1986, 1990 e 1993. Uma análise objetiva do início da estação chuvosa para esta região com base nesses dados diários está sendo efetuada em estudo complementar.
Fig. 5 - Séries temporais de precipitação diária para o período de maio a agosto, 1979 a 1997.

Fig. 6 - Séries temporais de precipitação diária para o período de setembro a dezembro de 1979 a 1997.

5- Variabilidade diária de nebulosidade média espacial na região Sudeste

A média espacial de valores digitais de imagens de satélite no canal infravermelho na região (150S-240 S; 540W-400W) é apresentada na Fig.7, para o período de agosto a fevereiro dos anos de 1996 a 2000. Nota-se que a permanência de valores altos, que indicam presença de nebulosidade convectiva, ocorre a partir do mês de novembro, embora em outubro haja ocorrência de vários dias com valores altos. Dentre esses quatro anos, houve ocorrência de nebulosidade convectiva em setembro apenas em 1996. Uma análise objetiva do início de ocorrência de atividade convectiva na região será apresentada em análise complementar.

Fig. 7 - Média espacial de valores digitais de imagens de satélite no canal infravermelho na região (150S - 240 S; 540W - 400W) para o período de agosto a fevereiro dos anos de 1996 a 2000.

6. Conclusão

Algumas situações de períodos prolongados de estiagem na região Sudeste ocorreram em anos passados. A situação mais crítica ocorreu no ano de 1993, quando anomalias negativas intensas foram registradas em janeiro, março, continuando negativas durante o ano e aumentando de intensidade em outubro, novembro e dezembro. Há uma tendência em haver anomalias negativas em anos La Nina. Em anos de El niño pode ocorre tanto anomalias positivas quanto anomalias negativas.

As séries temporais diárias de precipitação de 1979 a 1997 mostram que ocorrem períodos com precipitação persistente durante o inverno, porém com valores mais baixos do que na primavera e verão. Há grande variabilidade interanual com relação ao início da estação chuvosa na região Sudeste, porém na média esta ocorre no final de outubro;começo de novembro.

A situação das chuvas na próxima estação chuvosa da região Sudeste e sul do Nordeste será de fundamental importância para que haja um restabelecimento das condições normais das hidrelétricas e da utilização de energia elétrica nas regiões afetadas. Análises complementares estão sendo efetuadas e serão apresentadas nos próximos meses.

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